quarta-feira, 31 de outubro de 2007

"Não sabendo porquê, havia naquelas ruínas - como em tantas outras - qualquer coisa que despertava em mim o sentimento de pertencer a algo muito maior que este "Hoje", onde passeava, indolente, junto ao muro. Preocupava-me apenas em apreciar o silêncio reconfortante da História muda de um edifício em ruína - este, mas um qualquer - pautado apenas pelo grasnar ocasional de um corvo. Encontrava nesse fio telefónico, onde pousava o corvo, muitas semelhanças comigo mesmo: ele, nesse seu anúncio de tecnologia, e eu, passeando de calças de ganga de telemóvel no bolso, éramos corpos estranhos e despropositados naquele espaço onde as árvores murmuravam as sombras de vidas passadas, o mesmo espaço que nos concedia o privilégio de lhe pertencer. Ilusão minha, talvez; mas à medida que me preocupava em esquecer-me dos meus pensamentos, olhei para cima - talvez por causa do corvo -, e foi então que me apercebi: daquela janela, o Passado, não o das ruínas, mas o passado vivo, olhava para mim, como quem se ri do mal vestido..."


Em resposta a um desafio do Sorumbático. Fotografia de Carlos Pinto Coelho.

1 comentário:

Anónimo disse...

Nota: descobri depois que eram pombos e não corvos, e que a fotografia era na verdade do Convento do Carmo. Poética...